quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Os sofrimentos atuais: seu diagnóstico e sua cura

O panorama dos sofrimentos ou transtornos chamados “psíquicos” ou mentais experimentou, nos últimos vinte anos, uma transformação muito intensa e complexa. Não só mudaram os conjuntos de sintomas que anteriormente configuravam um quadro mais ou menos identificável como “diagnóstico” X ou Y, mas também se nota que esses quadros se somam e se mesclam entre si incessantemente, e aparecem outros quadros até então desconhecidos; e, o curso, a duração, a gravidade dos sintomas tampouco é igual ao que há algumas décadas se considerava típico e inamovível para as “enfermidades” clássicas ou, geralmente consideradas como tais, pelos especialistas. Tudo faz pensar que essas transformações da patologia são coerentes com as peculiaridades da vida apresentadas nos grandes conglomerados humanos, nos últimos tempos. Os signos e sintomas das “afecções” são de aparição brusca e espetacular, podem desaparecer por si mesmos, ou em virtude de algumas medidas inteligentes tomadas pelos afetados, agravam-se rapidamente e entram em crises severas que exigem tratamentos importantes ou se complicam com outras que, aparentemente, são da área de outra especialidade e que devem ser tratadas por ela. Sem querer estabelecer conexões diretas, não se pode deixar de reconhecer que a existência contemporânea, com sua rapidez, sua variabilidade, seu alto nível de exigência, seu grau de insegurança, a multiplicação de ofertas para o consumo, as mudanças e readaptações constantes, os traumas de todos os tipos perseguindo e golpeando continuamente...superam as capacidades de antecipação e de recuperação ativa dos indivíduos, das famílias, dos grupos, das organizações, movimentos,etc.
Esse panorama mostra, com uma clareza espantosa, o que já se sabia desde muito tempo, a saber: que não existe transtorno nem sofrimento, seja em qualquer campo no qual se manifestem, predominantemente, seus signos e sintomas (“psíquicos” ou “subjetivos”, “somáticos ou corporais”, “ sociais ou de comportamento”, etc.) que não devam ser investigados por operadores com uma formação e uma cultura muito amplos e/ou por equipes multidisciplinares e tratados da maneira correspondente. Mais ainda: é bastante freqüente que o mal-estar de que se trata, seja solucionado com poucas mudanças no estilo de vida, ou seja, de costumes, de alimentação, higiene, sonho, lugar de residência, relações sentimentais, familiares, de trabalho, descanso, diversão, esporte, sociabilidade, afiliação e militância em alguma causa nobre, etc.
Mas é claro que cada uma dessas mudanças, aparentemente simples, não são nada fáceis de realizar para a enorme maioria das pessoas que são obrigadas a enfrentar esta vida cruel. Boa parte das mesmas requerem grandes decisões e ações coletivas que parecem estar muito longe do que costumamos entender como “tratamentos”. Não obstante é preciso que se tenha certeza total de que cada uma dessas áreas e atividades são sempre com-causas, ou seja, causas conjuntas, de sofrimentos e transtornos que se apresentam como “ problemas de saúde” física ou mental e que podem “curar-se” tomando os conjuntos de medidas combinados e adequados a respeito.

Por outro lado, é fundamental aprender a desconfiar e a não se entregar indiscriminadamente a qualquer tratamento dos chamados “alternativos” que provém de uma cultura ou de uma época que não é a contemporânea. Entre eles há alguns que invocam descaradamente supostos saberes e procedimentos mágicos ou supersticiosos. A força da crença, que ninguém ignora, pode até produzir efeitos de alívio circunstanciais, mas os mesmos não fazem senão retardar o diagnóstico amplo e correto ao que nos referíamos, causando o agravamento, a complicação ou a irreversibilidades do transtorno em questão. Como dizia um experimentado professor: “ Por paradoxal que pareça, nada mata mais que os milagres”.

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