domingo, 13 de setembro de 2009

Por Gregorio Baremblitt

A ONU acaba de publicar uma estatística que diz que o mundo tem um bilhão de famintos ou "hipo-alimentados". Consideram-se como tais aos indivíduos que consomem menos de 1800 calorias por dia. A organização revela que estamos pior que uma década atrás.
Mais ou menos uma década atrás, eu escrevi em um livro que, segundo cálculos apenas aproximativos (estudando muitos países, não todos), era possível que um terço da humanidade fosse faminto ou hipo-alimentado.
Para justificar essa afirmativa, cabe lembrar alguns dados importantes. Em primeiro lugar, é impossível saber exatamente quantos famintos existem, porque durante a pesquisa morre considerável quantidade deles. Em segundo lugar, é preciso lembrar que se pode chegar a ingerir quase 18oo calorias comendo lixo, ratos, ingerindo álcool, ou devorando-se uns aos outros, como acontecia (ou acontece) em muitos lugares da terra. Seria muito interessante acrescentar a esse número os que morrem de sede, ou de frio, ou de enfermidades próprias da falta de saneamento básico, ou de medicamentos e intervenções médicas de todo tipo... ou seja, de miséria. Já não falemos das guerras de todo tipo, do terrorismo (de grupos fundamentalistas ou de Estado), os conflitos armados de classes, socioeconômico, políticos, nacionais, raciais etc.
O país mais rico do mundo, só para dar um exemplo, acaba de "dar-se conta" de que tem 50 milhões de habitantes sem cobertura médica. No Brasil, apenas para mencionar alguma das terríveis injustiças com as que convivemos, para "castigar" os latifundiários de cana-de-açúcar, se eximiu os patrões de dar comida quente de graça para os bóias-frias cortadores (vários dos quais morrem no trabalho).
Ultimamente tem se insistido em que, para lutar contra a exploração, a dominação e a mistificação que são os causadores desse genocídio contínuo da humanidade, não basta como escrever em um blog; é preciso, obviamente, sair à rua, protestar, denunciar, votar adequadamente etc. Estou completamente de acordo, mas, devido a minha idade e condição de estrangeiro, não posso, lamentavelmente, militar dessa maneira. "Alguma outra coisa" fiz e faço.
Perseguem-me terríveis sentimentos a respeito: compaixão pelas vítimas, ódio pelos principais responsáveis, raiva e impotência... mas, principalmente, vergonha por ser parte de uma espécie que provoca ou permite essa mortalidade perfeitamente evitável. Pelo menos a fome e a sede melhorariam bastante com um imposto de 2 % do PIB planetário ( ou menos, sendo que os gastos em armas são de 10 a 15 vezes maiores!). Esse panorama que, em boa proporção é uma "vitória" do capitalismo mundial em vias de integração, é inseparável de uma nojenta concepção da "natureza do ser humano". Para essas doutrinas, não se trataria de um tipo de agente majoritário (não em número senão em competitividade feroz) produzido pela mega máquina composta das variedades da economia capitalista, parte importante dos Estados (tanto os tirânicos, os totalitários, absolutistas e mafiosos, como os liberais, social-democratas etc). Isso seja dito sem estender-me acerca da maioria das maquinárias familiares, educacionais, comunicacionais, religiosas, sindicais, artísticas, esportivas e ainda dos movimentos e correntes da chamada "sociedade civil".
Trata-se de uma "visão pessimista" a minha e de muitos outros. Não sou capaz de ver os "avanços" acontecidos na modernidade na pós-modernidade (ou como se queira chamar a esta época infame). O problema consiste em que a poção mais importante desses "avanços" não chegam a encher o estômago de uma terceira parte dos povoadores do "globo".
Embora não interesse a ninguém o que muitos sentimos... Enquanto exista um bilhão de esfomeados e sedentos mais um bilhão de mal alimentados... Nós, que comemos e bebemos suficientemente, formamos parte de uma imensa escala de graus de desumanidade, se é que se quer conservar essa palavra obsoleta.
É claro que seguramente esta constatação não surpreenda, nem mobilize a muitos. A indignação é um afeto triste, bastante difundido, mas não o suficiente. Ocorre que é difícil diferenciar as euforias (tanto dos abastados como a dos populares) das inúmeras modalidades do "pão e circo" que os entusiasmos "produzidos" alimentam. Nunca consegui entusiasmar-me com a "resistência" micropolítica dos fakires.
A soma das indignações é perfeitamente compatível com as de alegrias reformistas e ainda com as micros ou macros revolucionárias.

Um comentário:

Tania Montandon disse...

Uno no tiene lo que merece? De un modo o de otro és siempre muy facil venir con la justificación 'cliché' de los sofismas bien adornados haciendonos creer que todo és nuestra opción!